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quarta-feira, 24 de abril de 2013

OS FILHOS DO DIVÓRCIO / Anna Paula Buchalla

A terapeuta americana afirma que a
separação dos pais faz muito mal às
crianças e deixa uma marca que elas
carregarão pelo resto da vida

Durante 25 anos, a terapeuta americana Judith S. Wallerstein ouviu os relatos das experiências de 131 filhos de pais separados. A maioria dos casos foi acompanhada da infância à idade adulta. Judith comparou as trajetórias de seus entrevistados com as de integrantes de famílias intactas e chegou à conclusão de que, ao contrário do que pregam os arautos da "nova família", o divórcio faz mal, sim, a crianças e jovens. Ser filho de um casal que se separou, segundo ela, é um problema que nunca cessa de existir. O resultado de seu trabalho está no livro The Unexpected Legacy of Divorce (A Inesperada Herança do Divórcio), em co-autoria com Julia M. Lewis e Sandra Blakeslee. Foram mais de 75.000 cópias vendidas desde o lançamento, em setembro. Envolta em polêmica, a obra ganhou destaque na imprensa americana e chegou a ser capa da revista Time. Aos 78 anos, casada há cinqüenta, três filhos e cinco netos, Judith Wallerstein é conferencista emérita da Universidade da Califórnia e uma crítica dura do que chama de "cultura do divórcio". "Casais que vivem uma situação conjugal morna deveriam considerar seriamente a possibilidade de continuar juntos pelo bem de seus filhos", diz ela, sem medo de chocar. Da cidade de Belvedere, nos arredores de San Francisco, onde mora, Judith Wallerstein deu a seguinte entrevista

ENTREVISTADOR- Como AFETA a separação dos pais a vida de uma criança?
ENTREVISTADO– De várias formas. A adolescência começa mais cedo para filhos de famílias que sofreram um processo de separação. No caso das meninas, a iniciação sexual costuma ocorrer antes do recomendável. Boa parte das crianças passa a ocupar-se dos problemas da mãe e, algumas vezes, dos conflitos do pai. Não raro, elas têm de desenvolver por conta própria seus conceitos de moralidade. Os mais velhos tendem a cuidar dos irmãos mais novos, como se fossem adultos. Está provado também que filhos de casais separados sofrem mais de depressão e apresentam mais dificuldade de aprendizado que os provenientes de famílias intactas.




ENTREVISTADOR– Mas há separações amigáveis e litigiosas. Não existe aí uma diferença?
ENTREVISTADO – Por mais que haja diferenças de caso para caso, a verdade é que não existe separação sem danos, perdas e tristeza. Em geral, o que ocorre é que um dos dois – o marido ou a mulher – quer o divórcio e o outro não. É ilusão imaginar um casal sentado calmamente à mesa da cozinha, mantendo uma conversa civilizada do tipo: "Cometemos um erro e devemos nos separar". Isso nunca, jamais acontece. E mais: as duas partes não encerram seus conflitos na Justiça. Sentimentos de amor e ódio não deixam de existir com a assinatura da papelada. Esse quadro de desgaste contínuo, não importa o grau, fere indelevelmente as crianças. É certo que há pais que tentam preservar ao máximo seus filhos do sofrimento de uma separação. Mas também é verdade que a decisão de "não brigar na frente das crianças" tem suas limitações. Evitar discussões não as protege dos efeitos de longo prazo do divórcio, que aparecem na vida adulta.

ENTREVISTADOR – Quais são esses efeitos?
ENTREVISTADO – A maioria dos filhos do divórcio – vamos chamá-los dessa forma – atribui à separação dos pais grande parte de seus insucessos nos relacionamentos. A imagem negativa do casamento leva muitos a fazer péssimas escolhas de parceiros ou a fugir de compromissos. Cerca de 40% não consegue casar-se quando atinge a idade adulta. Há um contingente enorme de homens e mulheres na faixa dos 30 anos que, traumatizados com a experiência de seus pais, vivem sozinhos. Isso não significa, evidentemente, que eles não valorizem o amor, a fidelidade e o companheirismo. Apenas têm dificuldade em lidar com seus sentimentos e traduzi-los na construção de uma vida a dois. O dado paradoxal é que, apesar de tudo, o desejo de um casamento duradouro permanece irremovível.



Foto: OS FILHOS DO DIVÓRCIO

A terapeuta americana afirma que a
separação dos pais faz muito mal às
crianças e deixa uma marca que elas
carregarão pelo resto da vida

Anna Paula Buchalla

Durante 25 anos, a terapeuta americana Judith S. Wallerstein ouviu os relatos das experiências de 131 filhos de pais separados. A maioria dos casos foi acompanhada da infância à idade adulta. Judith comparou as trajetórias de seus entrevistados com as de integrantes de famílias intactas e chegou à conclusão de que, ao contrário do que pregam os arautos da "nova família", o divórcio faz mal, sim, a crianças e jovens. Ser filho de um casal que se separou, segundo ela, é um problema que nunca cessa de existir. O resultado de seu trabalho está no livro The Unexpected Legacy of Divorce (A Inesperada Herança do Divórcio), em co-autoria com Julia M. Lewis e Sandra Blakeslee. Foram mais de 75.000 cópias vendidas desde o lançamento, em setembro. Envolta em polêmica, a obra ganhou destaque na imprensa americana e chegou a ser capa da revista Time. Aos 78 anos, casada há cinqüenta, três filhos e cinco netos, Judith Wallerstein é conferencista emérita da Universidade da Califórnia e uma crítica dura do que chama de "cultura do divórcio". "Casais que vivem uma situação conjugal morna deveriam considerar seriamente a possibilidade de continuar juntos pelo bem de seus filhos", diz ela, sem medo de chocar. Da cidade de Belvedere, nos arredores de San Francisco, onde mora, Judith Wallerstein deu a seguinte entrevista 

ENTREVISTADOR- Como AFETA a separação dos pais  a vida de uma criança?
ENTREVISTADO– De várias formas. A adolescência começa mais cedo para filhos de famílias que sofreram um processo de separação. No caso das meninas, a iniciação sexual costuma ocorrer antes do recomendável. Boa parte das crianças passa a ocupar-se dos problemas da mãe e, algumas vezes, dos conflitos do pai. Não raro, elas têm de desenvolver por conta própria seus conceitos de moralidade. Os mais velhos tendem a cuidar dos irmãos mais novos, como se fossem adultos. Está provado também que filhos de casais separados sofrem mais de depressão e apresentam mais dificuldade de aprendizado que os provenientes de famílias intactas.




ENTREVISTADOR– Mas há separações amigáveis e litigiosas. Não existe aí uma diferença?
ENTREVISTADO – Por mais que haja diferenças de caso para caso, a verdade é que não existe separação sem danos, perdas e tristeza. Em geral, o que ocorre é que um dos dois – o marido ou a mulher – quer o divórcio e o outro não. É ilusão imaginar um casal sentado calmamente à mesa da cozinha, mantendo uma conversa civilizada do tipo: "Cometemos um erro e devemos nos separar". Isso nunca, jamais acontece. E mais: as duas partes não encerram seus conflitos na Justiça. Sentimentos de amor e ódio não deixam de existir com a assinatura da papelada. Esse quadro de desgaste contínuo, não importa o grau, fere indelevelmente as crianças. É certo que há pais que tentam preservar ao máximo seus filhos do sofrimento de uma separação. Mas também é verdade que a decisão de "não brigar na frente das crianças" tem suas limitações. Evitar discussões não as protege dos efeitos de longo prazo do divórcio, que aparecem na vida adulta.

ENTREVISTADOR – Quais são esses efeitos?
ENTREVISTADO – A maioria dos filhos do divórcio – vamos chamá-los dessa forma – atribui à separação dos pais grande parte de seus insucessos nos relacionamentos. A imagem negativa do casamento leva muitos a fazer péssimas escolhas de parceiros ou a fugir de compromissos. Cerca de 40% não consegue casar-se quando atinge a idade adulta. Há um contingente enorme de homens e mulheres na faixa dos 30 anos que, traumatizados com a experiência de seus pais, vivem sozinhos. Isso não significa, evidentemente, que eles não valorizem o amor, a fidelidade e o companheirismo. Apenas têm dificuldade em lidar com seus sentimentos e traduzi-los na construção de uma vida a dois. O dado paradoxal é que, apesar de tudo, o desejo de um casamento duradouro permanece irremovível.

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