Anos atrás fui comprar uma luminária na rua da Consolação. A que escolhi, o vendedor disse custar R$ 250,00. Achei caro demais. Ele sorriu:
- Na verdade, custa R$ 85,00. É a tática que uso para o freguês comprar na hora.
Assim aconteceu com a tal pesquisa do Ipea. No primeiro momento, disseram que 65% dos brasileiros concordavam total ou parcialmente com a frase: “Mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”.
Uma semana mais tarde, esse número foi corrigido para 26%. A reação foi de alívio e de revolta contra o Ipea, como se em cada quatro brasileiros um estar a favor do ataque fosse pouco.
A mesma pergunta refeita em São Paulo pelo Datafolha encontrou 12% de respostas positivas.
Quando o Datafolha substituiu a palavra atacadas por estupradas, 9% de nossos respeitáveis conterrâneos consideraram o estupro justificável.
O estupro é prática descrita em orangotangos, gorilas e chimpanzés, nossos parentes mais próximos.
Veja o caso dos orangotangos, primatas como nós, que passam a vida em cima das árvores. Os machos chegam a pesar 90 quilos, enquanto alguns não passam de 40, peso igual ao das fêmeas. A dominância é disputada pelos mais encorpados, que se enfrentam em lutas renhidas, mas que jamais acabam em morte; terminam quando o perdedor volta as costas para o adversário e se retira.
Os etologistas nunca entenderam como os machos pequenos conseguem se reproduzir, uma vez que são rejeitados pelas fêmeas, sempre interessadas nos grandes, mais aptos a proteger-lhes a prole.
Observações de campo mais recentes encontraram a explicação: os pequenos são estupradores. Atacada por um deles, a fêmea berra e se defende com todas as forças. Ao ouvir-lhe os pedidos de socorro, o macho-alfa corre pelos galhos das árvores para ajudá-la.
Mais ágeis, os pequenos fogem. Quando não conseguem, são espancados e atirados lá de cima. Chegam a morrer na queda, incidente que não ocorre entre os machos grandes em luta pela supremacia.
Agressões semelhantes contra estupradores são descritas em gorilas e chimpanzés. Do ponto de vista evolutivo, a explicação é lógica: aqueles incapazes de defender suas fêmeas, não transmitiram seus genes à descendência.
Seres humanos não são diferentes.
As agressões mais torpes a que assisti, foram perpetradas contra estupradores presos. No antigo Carandiru, o mínimo que lhes acontecia era serem esfaqueados pela turba enfurecida. Num deles, contei mais de quarenta facadas.
Quando perguntei a um dos detentos que havia carregado o corpo até a enfermaria, por que razão respeitavam o assassino de um pai de família, enquanto barbarizavam o estuprador, ele respondeu com voz pausada:
- Quem mata uma pessoa, pode passar o resto da vida sem matar mais ninguém. O estuprador vai sair daqui e atacar outra mulher, que pode ser a sua filha ou a minha irmã. Esses caras são anormais.
Não lhe tiro a razão. De fato, aceitamos com mais condescendência um assassino do que o estuprador. O estupro é o mais abjeto dos crimes.
Vamos falar de homem para homem, prezado leitor. Quem nunca passou pela experiência de estar a sós com a mulher desejada, ardente, em ambiente acolhedor, e fracassar?
Se nas condições mais favoráveis a impotência pode nos surpreender, imaginar que alguém consiga manter ereção enquanto agarra uma mulher desesperada, que grita, chora, tenta fugir e pede pelo amor de Deus para não ser violentada, está além da compreensão masculina.
Homem nenhum tem direito de atacar uma mulher, sob nenhum pretexto. Nem que ela esteja nua, num banco de jardim. Sexo não consentido é uma brutalidade criminosa que precisa ser punida com rigor.
Partir do princípio de que roupas decotadas justificam agressões sexuais, é aceitar que todas as mulheres possam ser estupradas em nossas praias ou nas cidades com verões escaldantes. Para evitar ataques, o que elas deveriam esconder? As pernas, os ombros, os braços, o colo? Não seria mais prudente andarem de burca?
Jogar a culpa na vítima é compactuar com a natureza do crime cometido contra ela. A questão é simples: estupradores são maníacos sexuais que precisam ser afastados do convívio social.
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