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segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Carta a sua criança interior ferida / Maria de Fatima Jacinto


Carta a sua criança interior ferida


Estou escrevendo para você que foi ferida na infância por seu pai, por sua mãe, que sofreu o medo da violência, do estupro, do desamparo, da injustiça, que viveu a impotência diante do mais forte na fase de sua vida que deveria ser  alegre leve e feliz.
Você que "envelheceu" antes do tempo diante da brutalidade daquele que deveria proteger e não punir.
Existe uma linda mulher dentro de você, sua Alma é plena de beleza, amor e Luz.
A Alma  é o corpo do Esplendor do Espírito, do Buda, do Cristo Interior.
A violência física pode ter tirado das suas mãos o rolo de lã que tece o seu próprio destino, roubou-lhe o fio das ilusões, dos sonhos que tecem o futuro.
O que  nos leva a seguir em frente é a Esperança, a coragem, a confiança na justiça, no amparo e na proteção da vida e de Deus.
Você que conheceu o medo que paralisa diante da morte as vítimas da violência.
Você  criança que não compreendeu a violência do mundo e achou que era sua  culpa.
Aquele que me violenta, entra na minha mente, no meu mundo interno como parte de mim e planta a semente do medo, do fracasso, da impotência, do ódio no cenário da mente;
 O agressor  entra na mente como um adversário internalizado - parte de mim -  perseguidor, reativo que se alimenta das emoções , da tristeza e do sentimento de inferioridade; e como um parasita é alimentado pelo ódio  e continua  em cena no agora querendo me destruir;

“Clandestinamente, ou inconscientemente planta as sementes na terra que nascem os frutos “daquilo” que mais me aterroriza...”
Em nossa estória, vivemos várias situações e vários cenários e várias personagens. Aquele que está paralisado no trauma,  que viveu no tempo de violência do passado, pode no agora, entrar em cena  “vestido com o personagem ferido, vencido, raivoso, impotente e dominado de ontem...
" Um dia, eu vejo que nasceu no meu caminho, em minha vida em minha mente, cerca de espinhos intransponíveis, como se fossem colocadas ali, por mim".

O medo da rejeição e do abandono persegue aqueles que foram rejeitados e abandonados na infância. Este sentimento transforma em vítimas todos aqueles que na infância ficaram sujeitos ao desamparo e à dor. Sua percepção, distorcida de si-mesmo, deriva das suas experiências infantis traumatizantes;
  E assim, aprisiona a alma no passado, produz fixações em sentimentos de inferioridade, de baixa autoestima, induz uma percepção irreal de si mesmo.
O opressor entra, e fica... por isso a mulher ferida  pode carregar  pelo resto da  vida esta figura internalizada, e projeta o seu ódio em todos os homens que poderia amar. Seus  olhos podem procurar  inconscientemente alguém parecido com ele para destruir, e por infelicidade do destino, acaba escolhendo homens iguais a ele.
Muitas vezes, a mulher perde o contato com a essência feminina, e revela um comportamento muito yang, reativo, porque não quer ser como a passiva sombra da  mãe que era invisível dentro de casa diante da figura opressiva do  pai.
Quanto mais luta contra ele, com o ódio, com a revolta mais forte ele fica, como a “hidra de Hércules”, porque a luta acontece no campo da nossa psique, e assim, você luta com  suas energias, contra si mesmo.
A compreensão da realidade divina interna desfaz todas as ilusões e o autoconhecimento leva a pessoa  a abandonar a falsa autoimagem construída no passado.
“O autoconhecimento sempre leva ao reconhecimento da verdadeira essência que reside na Alma, que revela a natureza divina que foi esquecida”.
E, se o medo toma conta da nossa vida, nos afastamos do centro da luz, e assim, muitas mulheres se tornam escravas de um Deus cruel, impiedoso em uma religião severa e castradora.
Perdemos o contato com a Fonte generosa e doadora da vida.
Muitas mulheres que sofreram a violência do "animus", não conseguem relacionar com o sexo oposto e preferem viver afetivamente com outra mulher para não enfrentar a figura terrível masculina internalizada projetada no parceiro. 
A sua ferida é tão grande, que mobilizou seus instintos de agressividade,
e você vive reagindo ao mundo com raiva, ódio, e agressividade, como um bicho ferido; em situações de conflito você fica possuída por este “demônio”, e agride os outros como ele.
Ele entrou na sua pele, através da força - naquele tempo  não havia defesa, nem proteção.
Ele é um ferido, você é uma ferida, somos marcados pela tatuagem da agressão,quando  na infância não  conseguimos estruturar  o próprio "eu"  no início do  nosso desenvolvimento.
Mas, você precisa compreendê-lo porque se não perdoa,  não liberta - "ele" dentro de você -  como você, não há liberdade.
Mas, você tem usado a emoção, seus sentimentos doloridos para lidar com esta dor, agora é necessário usar a mente, a inteligência,  a esperança, a alegria, a compreensão para a sua liberação.

Dessa maneira, as defesas do ego passam ao largo das tensões e da dor, mas a tensão e a dor permanecem. São registradas à nível cortical como um desequilíbrio, uma sequência de ação abortada, esperando para ser libertada e integrada.  A energia do trauma original permanece como uma tempestade  elétrica que faz ecoar a tensão por todo o sistema biológico.
As pessoas com vidas adultas aparentemente racionais podem estar levando também uma vida de tempestade emocionais internas. Suas tempestades continuam porque sua dor original não foi resolvida”.
Muitas mulheres não conseguiram amadurecer, estruturar um “eu adulto”, e sofrem muito por isto; e não assumem responsabilidades importantes para uma pessoa emancipada, muitas vezes são excluídas do mundo profissional, do grupo de amigos...
Você precisa compreender que a vida colocou você neste lugar, por algum motivo. A reencarnação é uma explicação para tamanha injustiça.
Eu penso que repetimos cenas e vivemos cenários várias vidas, com os mesmos personagens e que atraímos à nossa atmosfera a pestilência das nossas concepções.
Hoje vítima, amanhã algoz e assim, vamos repetindo.
Você precisa de um significado que "dê conta" deste seu sofrimento para a sua liberação.
Quando o "eu", "dá conta"  de compreender os sintomas, quando consegue o significado consciente da sua dor, ele se libera.
O que precisamos  é acabar com o comportamento compulsivo. Agimos compulsivamente. Podemos até ser compulsivos até a conscientização de alto nível, adultos letrados, acadêmicos , mas... Repetimos nossa compulsão e a raiva não passa, o ódio arde no peito...
O ódio nos escraviza e é uma energia em ação que "ocupa"  o lugar da alegria, da generosidade e do amor, ele precisa ser libertado, redimido.
Nós  precisamos abraçar a solidão da nossa criança de coração partido, e a sua dor não resolvida, pela infância perdida. Temos que abraçar a nossa dor original. 
Abraçar a criança que fomos e amá-la nos torna forte.
 Esse é o sofrimento verdadeiro do qual fala  Carl Jung.
Você precisa  da autoconfiança suficiente para ser a aliada da sua criança interior no trabalho da dor, sem culpas, sem remorso.
Há uma tendência da sociedade a criar uma imagem do Pai/Mãe santos, divinos, puros, íntegros como santos.
Mas, pouco se fala do Pai/Mãe sem caráter, cruel, oportunista, vigarista...

É necessário compreendê-lo com a razão, sem  se colocar no lugar do algoz, da menina que foi “má”; e por isto precisa sofrer;  você não é a menina que é “má”, feia, rancorosa, um “bicho ruim’ como o seu pai, que  briga e tem ódio como um monstro que quer se destruir e a todos.

Quando a criança agredida idealiza os pais, como sagrados e onipotente, ela  acredita que é a única responsável pelo abuso de que é vítima.
Esta criança pensa que não merece ser feliz, que merece a punição de Deus.
Que ela é suja, contaminada...
Esta experiência traz consequências negativas para a vítima ao longo do seu desenvolvimento cognitivo, afetivo, comportamento e social e principalmente para os seus relacionamentos interpessoais futuros..
Ai, você começa a ser má com consigo mesma, nega inconsciente as boas escolhas da vida, afinal você pensa que não merece, que é má, violenta, agressiva e  você ( o eu) pode pensar, ou determinar sua punição -  a degradação.
Neste momento, você precisa gostar muito de você, só o puro e verdadeiro amor por sua criança interior pode liberar este “falso eu”, pode liberar a voz do “animus terrível” que lhe diz que “você não presta para nada’, que “você é um zero à esquerda”.
Quando você abraça sua raiva, sua dor, você libera sua alma, seu “verdadeiro eu”.
Quando você defende sua criança interior ferida ela  começa a confiar em você.
Mas, este processo exige que você compreenda a existência do seu pai, seu algoz como ser humano, como personagem da estória da sua vida.
Ele é um ferido, um transfigurado, violentado na infância por sua mãe.
Ele repete na sua vida e perpetua a sina do oprimido e do opressor.
Ele "enlouqueceu" de tanto sofrimento e tentou te enlouquecer como ele.
“Isto corrobora a teoria de que uma vez estabelecido o material central da infância, ele atua como um filtro supersensível para moldar eventos subsequentes”.
Quando um adulto com uma criança ferida experimenta uma situação similar a um acontecimento doloroso protótipo, a resposta original também é detonada.
Você ( o eu) precisa  perdoá-lo para se liberar, o ódio é uma corrente que nos aprisiona ao outro por várias vida.
O perdão irá liberar a luz da bondade, da compaixão que irá liberar os dois personagens da sua estória.
Você poderá perdoá-lo internamente, não precisa procurá-lo se você não sentir que está preparada para isto.
Você precisa perdoar no seu mundo interno primeiro.
“Quando sentimos a conexão com nossa criança, começamos a ver toda a nossa vida com uma perspectiva muito amO encontro com a religiosidade luminosa, plena de compaixão, que não julga, não condena, aceita e ama nos leva ao centro da Fonte,
E assim, libera esta alma ferida da roda da vida.
Muitas mulheres encontram sua redenção na figura feminina da Grande Mãe, de muitos nomes que ilumina muitas religiões para que acolha sua criança interior e cure suas feridas.
Mas, é importante  a harmonia com a figura de um Deus masculino, para integrar os opostos, para a harmonia da polaridade interna com o sexo oposto.
A regeneração criativa é a essência da própria vida.  A criatividade é a glória da alma, é o que nos distingue de todos os seres criados.
A alegria é a porta da felicidade que nos libera.
“ Ser criativo não é apenas nossa coroa de glória. É a nossa verdadeira imagem de Deus. Criar é ser como nosso criador no mais verdadeiro sentido da palavra.”
É necessário libertar-se do cenário do passado, conquistar a liberdade do aqui e do agora, com o perdão.

Este texto foi inspirado no livro de John  Bradshaw. Volta ao Lar . como resgatar e defender a sua criança interior.pla. A criança  não precisa mais se esconder atrás das defesas do ego para sobreviver. A criança  não é um eu melhor, é um eu diferente, único com uma visão muito ampla”.

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