Mas as razões para as vaias (os aplausos existiram em bom número) transitam mais no campo ético do que no estético em "Miss Violence". O drama é um pesado jogo de dominó sobre incesto e prostituição infantil que vai sendo derrubado até atingir quase o insuportável - o que deve ferir os sentimentos de boa parte do público.
"Miss Violence" começa de forma acachapante: no meio da festa por seu aniversário de 11 anos, a menina Angeliki (Chloe Bolota) pula sem a menor cerimônia da varanda do apartamento. O que vem a seguir é ainda mais estranho. A família parece pouco afetada pelo caso, chegando até mesmo a usá-lo para conseguir certos benefícios ou desculpas por comportamentos erráticos.
Sua mãe, Eleni (Eleni Roussinou), está mais preocupada com seu bebê de pai desconhecido, o avô (Themis Panou) só pensa na educação rígida, quase militar de seus netos pequenos, Alkmini (Kalliopi Zontanou) e Filippos (Konstantinos Athanasiades). A avó (Reni Pittaki) parece inerte a emoções. Apenas a menina do meio, a adolescente Myrto (Sissy Toumasi), parece sentir algo - talvez por ser apenas um pouco mais velha que a irmã morta.
Aos poucos, o véu de normalidade da família vai saindo da frente e a sujeira transborda mostrando como o avô, na verdade, é um gigolô, usando as netas - que podem ser filhas, já que fica explícito que há abuso sexual -, como prostitutas rasas e a mulher como saco de pancadas.
O filme choca mais pelo tratamento do velho em assuntos banais humilhantes do que em sequências gráficas que revelam seu segredo. Em determinado momento, ao ouvir que o neto seria um pouco agressivo na escola, ele obriga o menino a levar uma dezena de tapas da irmã sem reagir.
Alexandros Avranas traça um paralelo entre a família e a crise financeira da Grécia. Há doses fartas de críticas sociais, apesar do cineasta negar. "Não é uma metáfora, mas um símbolo de uma sociedade moderna doente. O filme tem um grande respeito pelos seres humanos, que parecem ser esquecidos numa crise que vai além da econômica, mas moral", conta o grego.
"Confesso que deixei tudo para trás, moral, política e preocupação social", completa o ator Themis Panou, aterrorizante no papel. "Construí meu personagem pensando em um homem que sente prazer em ter poder sobre as pessoas que ama."
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