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sábado, 24 de setembro de 2011

Psicanálise é usada contra violência doméstica no Rio

"É difícil não sentir raiva do agressor, mas é importante pensar que ele não se reduz a seu ato de violência. A gente não sabe o que se passa com ele até ouvi-lo. Nosso ponto de partida é oferecer um lugar de escuta"


Núcleo de Atenção à Violência de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, atende principalmente a crianças

Vítimas e autores de agressão procuram ajuda para falar sobre assuntos delicados, como abuso sexual

Desde que iniciou sua atuação em Nova Iguaçu (Baixada Fluminense), há três anos, o NAV (Núcleo de Atenção à Violência) já prestou atendimento psicanalítico gratuito a mais de 1.400 vítimas e autores de violência doméstica. Crianças representam a maior parte dos atendidos.
Apesar do expressivo número, a psicóloga Paula Ribeiro, coordenadora do projeto em Nova Iguaçu, evita generalizações sobre o perfil de vítimas ou agressores.
Cada caso tem sua singularidade, afirma ela, que lançou anteontem, no Rio, um livro em parceria com Simone Gryner, presidente do núcleo, sobre o projeto.
Uma das poucas características em comum a quase todos os atendidos pelo NAV é o fato de terem encontrado ali, pela primeira vez, um espaço para falarem e serem ouvidos sobre temas delicados, como o abuso sexual.
É justamente a partir do momento em que conseguem expressar o que sentem que muitos encontram meios para interromper esses atos.
No caso dos autores de agressão, Paula reconhece que aqueles que procuram ou aceitam o apoio do NAV são os que, de alguma forma, se incomodam com o ato cometido e demonstram alguma preocupação com a criança.
"O que encontramos aqui são muitas situações que acontecem meio que no piloto automático e que ganham vida, tomam corpo e têm consequências quando essas pessoas podem se escutar falando do que estão fazendo."
Já houve casos como o de uma menina que decidiu, por iniciativa própria, relatar uma tentativa de abuso por parte do pai ao Conselho Tutelar. Ela fugiu de casa, brigou com a mãe e o pai e se refugiou na avó.
Todos foram encaminhados ao NAV, onde puderam falar sobre o caso.
O pai contou que estava passando por muitos problemas, tinha bebido e não se lembrava do episódio. Mas disse que acreditava na versão da filha e que estava disposto a arcar com as consequências de seu ato.
A filha disse que se sentia mais segura depois de tudo e preparada para se proteger.
Foi graças a esse trabalho que a Justiça concluiu que todos poderiam voltar a morar juntos. Neste caso, como nos outros atendidos pelo NAV, foi fundamental não ter reduzido o agressor ao papel de um monstro a ser punido.
"É difícil não sentir raiva do agressor, mas é importante pensar que ele não se reduz a seu ato de violência. A gente não sabe o que se passa com ele até ouvi-lo. Nosso ponto de partida é oferecer um lugar de escuta", diz.

Da Folha de São Paulo de 24/09/2011


Esta postagem é uma contribuição à postagem anterior:
É preciso reconhecer a face humana daquele que nos horroriza

Um comentário:

  1. Obrigada, José Geraldo, por compartilhar um texto tão elucidativo. Abraços fraternais.

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